No mundo todo, as mulheres têm escolhido as ruas como o espaço para marcar a memória, a resistência e a luta simbolizadas no 8 de Março. Frente ao acirramento das desigualdades sociais, ao avanço da extrema direita em diversos países e dos ataques a direitos já conquistados, ocupar as ruas, hoje, continua a ser uma urgência para resistir aos ataques, manter conquistas e fazer avançar a transformação social. Seja nas periferias e favelas brasileiras, onde mulheres negras lutam diariamente contra a violência policial e pela sobrevivência de si mesmas e dos filhos e companheiros, ou nas aldeias, onde mulheres indígenas defendem suas vidas e seus territórios; seja na América Latina, onde argentinas defendem a conquista da legalização do aborto e os direitos sociais da população mais pobre e as chilenas brigam pela manutenção do aborto (em casos previstos em lei) na Constituinte; seja nas montanhas do México, onde as zapatistas mantêm a resistência do território zapatista livre; seja em Gaza, onde as Palestinas resistem ao genocídio e defendem a libertação do povo palestino. Elas dizem basta!
A PRECARIZAÇÃO DA VIDA SEGUE AUMENTANDO O LUCRO DOS CAPITALISTAS
Enquanto a fortuna dos cinco homens mais ricos do mundo dobrou nos últimos 4 anos, em torno de 5 bilhões de pessoas empobreciam ainda mais. Desde 2020, as riquezas dos cinco bilionários brasileiros aumentaram em 51%, enquanto 129 milhões de brasileiros ficaram mais pobres, segundo a Oxfam. Essa pobreza recai sobre os ombros das mulheres, já que mais da metade dos lares brasileiros são chefiados por elas - e, mesmo onde não chefiam, têm papel fundamental na economia das famílias, sobrecarregadas com trabalhos muitas vezes invisibilizados, como as tarefas domésticas e o cuidado de crianças e idosos.
Cenário ainda mais grave é visto em países vizinhos, como na Argentina, que sofre uma crise econômica aguda, onde a pobreza atingiu o maior patamar em 20 anos. O recém-empossado governo de Javier Milei sinaliza o aprofundamento das políticas neoliberais no continente. Além das medidas econômicas que vão recair sobre a classe trabalhadora, o governo de Milei pretende revogar a legalização do aborto no país, conquistada depois de forte mobilização das mulheres argentinas.
Já no Brasil, o governo de frente ampla de Lula e Alckmin tem comprovado os limites da conciliação de classes. A Nova Regra Fiscal atrela o orçamento a metas fiscais, o que impacta nos serviços públicos, como políticas públicas para proteção das mulheres. Vale lembrar que os investimentos nessas políticas já haviam sido reduzidos no governo Bolsonaro, e não há perspectiva para a melhora desse cenário, o que deixa vulnerável a situação das mulheres mais pobres. Segundo o Dieese, cerca de 40% das mulheres que trabalham recebem até um salário mínimo (entre negras, o índice chega à metade), muitas delas sem acesso a direitos e benefícios trabalhistas e previdenciários.
Em 2023, foi aprovada a Lei n° 1.085/2023, que trata da igualdade salarial entre homens e mulheres e critérios de remuneração. A lei dispõe apenas sobre o salário, e não sobre as remunerações como um todo. Além disso, reforçamos que muito da desigualdade não será resolvido por leis, mas com mudanças sistêmicas. Assim, funções que são desempenhadas majoritariamente por mulheres continuam com salários mais baixos, como nos casos das empresas terceirizadas de limpeza, das trabalhadoras domésticas ou de setores como saúde e educação.
OS ATAQUES E RETROCESSOS SEGUEM COM FORÇA NA POLÍTICA DE CONCILIAÇÃO DE CLASSES
Além dos limites das políticas institucionais, a direita e a extrema direita têm atuado para impulsionar ideias e projetos que retrocedem direitos das mulheres, de povos indígenas e LGBTs e da classe trabalhadora como um todo. A disputa do Congresso com o STF e a aprovação do Marco Temporal demarcaram o poder da direita, ao mesmo tempo que persiste a violência e a miséria no território Yanomami. A cruzada também se dá contra a possibilidade da legalização do aborto, com debate iniciado no STF, e ataques a direitos reprodutivos já conquistados, como aconteceu recentemente em São Paulo, com o fim do serviço de aborto legal em um hospital municipal de referência no procedimento.
Conforme o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2023, referente a dados de 2022, todos os indicadores de violência doméstica cresceram; os feminicídios tiveram aumento de 6,1% e as tentativas de feminicídios cresceram 16,9%; o país registrou o maior número de estupros da história, com um aumento de 8,2%, sendo as vítimas mulheres, crianças e adolescentes. As mulheres negras são a maior parte das vítimas. O Brasil é um dos países com maior índice de violência contra a mulher e feminicídios do mundo. Para as mulheres trans, é uma realidade assustadora: segundo os dados do “Dossiê: Assassinatos e violências contra travestis e transexuais brasileiras”, da Antra, o Brasil continua a ser o país que mais assassinou pessoas trans pelo 14º ano consecutivo.
A violência policial também afeta profundamente a vida das mulheres nas regiões periféricas. Elas estão na linha de frente das denúncias das torturas, prisões e até execuções de seus filhos e companheiros, como vimos recentemente em comunidades da Baixada Santista, Rio de Janeiro, Salvador e de outras periferias do Brasil.
Todo esse cenário nos mostra que temos urgência de uma transformação social profunda, que possa mudar essa realidade desde suas raízes - o que governo nenhum é capaz de fazer. O trabalho é árduo, a curto, médio e longo prazo, e passa pelo fortalecimento das mulheres organizadas e da classe trabalhadora. É essa organização, construída desde baixo, pautada pela independência de classe e combatividade, que dará uma resposta ao quadro de retrocessos e fará avançarmos rumo a um outro mundo possível. A classe trabalhadora precisa absorver, cada vez mais, as urgências de vida das mulheres e construir estratégias para superá-las, pois são demandas que estão no seio das lutas de classes e dependem delas. Dessa forma, é um enfrentamento que deve ser construído desde as bases, nas comunidades, nos sindicatos, nos locais de estudo, de modo coletivo.
MEMÓRIA, ORGANIZAÇÃO, LUTA E RESISTÊNCIA INTERNACIONALISTA!
Neste ano, completamos 40 anos do fim da Ditadura Militar no Brasil. E lembramos das várias mulheres que foram torturadas e assassinadas pelos militares. Sobretudo, trazemos a memória de suas resistências e lutas para continuarmos a caminhada de combate aos gérmens do autoritarismo que fundamentaram o estabelecimento dos militares no poder. E, se nossa luta pela libertação dos povos e pela construção de um mundo novo é internacional, ressaltamos, também, nosso dever de denunciar os crimes do Estado de Israel contra o povo palestino, que já assassinou mais de 8 mil mulheres e 13 mil crianças palestinas; intensificar a luta contra o genocídio palestino é dever de toda militância revolucionária.
Seguimos na construção das lutas das mulheres, por movimentos combativos e populares, que fortaleçam a organização e a resistência desde baixo contra os de cima!
Pela luta, resistência e vidas das mulheres!
Pela Revolução Social e o Socialismo Libertário!
Organização Socialista Libertária
8 de março de 2024