São Paulo submersa: o lucro, a exclusão e o colapso em tempos de crise climática

As cenas de alagamentos, desabamentos e colapso estrutural em São Paulo são mais do que eventos isolados: são sintomas de um modelo econômico e político que coloca o lucro acima da vida. A tragédia das chuvas, com o acumulado de 124 milímetros em poucas horas, resultou em 97 quedas de árvores, 219 pontos de alagamento – incluindo mais de 30 locais completamente intransitáveis – e cerca de 140 mil imóveis sem energia elétrica. Um idoso de 73 anos morreu ao ter a casa invadida pela água. A inundação de estações de metrô, como a da Sé, expôs a negligência estrutural: passageiros amontoados sob risco iminente, desabamentos como o do teto de um shopping e congestionamentos que atingiram 1.025 quilômetros de extensão completaram o cenário de caos. As tragédias causadas pelas chuvas não são apenas "desastres naturais", mas consequências diretas de uma organização social baseada na exploração, na acumulação de capital e na exclusão das classes oprimidas da gestão dos recursos e territórios. Trata-se de um fenômeno que, cada vez mais, tem se intensificado em todo território brasileiro e pelo mundo, potencializado pelas políticas da superexploração do neoliberalimo, do sistema capitalista-estatista.

Especulação imobiliária, exclusão social e a lógica do capital

O avanço desenfreado da especulação imobiliária cria uma segregação espacial que empurra os trabalhadores para periferias cada vez mais distantes. Essa dinâmica, fundamental para a reprodução do capital, nega às populações vulneráveis o direito a uma moradia digna e a um transporte eficiente. O Plano Diretor Estratégico de São Paulo, ao priorizar a verticalização desenfreada, agrava ainda mais a impermeabilização do solo e reduz a capacidade de drenagem natural da cidade. Essa política, atrelada à intensificação do desmatamento e à canalização de rios para favorecer grandes empreendimentos imobiliários, compromete os ecossistemas urbanos e expõe a população a desastres que poderiam ser evitados. A exploração do espaço urbano não é apenas uma consequência, mas uma necessidade estrutural do capitalismo, que utiliza o espaço como mercadoria e fonte de acumulação.

Privatizações, precarização e o papel do Estado

As privatizações e terceirizações refletem a ligação umbilical entre o Estado e as classes dominantes. Sob o neoliberalismo, o Estado se aprofunda como um gestor do capital privado, transferindo serviços essenciais para mãos privadas enquanto cada vez mais se abstém de qualquer responsabilidade com algum equilíbrio social. A cidade de São Paulo é exemplar dessa situação. A gestão de Ricardo Nunes (MDB) tem priorizado os interesses de grandes empresas, promovendo a terceirização e precarização dos serviços urbanos, como a drenagem e manutenção das vias públicas. Sua administração negligenciou políticas preventivas contra enchentes, mesmo diante de alertas climáticos recorrentes, optando por ações paliativas que não enfrentam as raízes do problema. Entre 2021 e 2023, a gestão municipal deixou de investir R$ 1,5 bilhão em combate a enchentes.

No âmbito estadual, o governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) segue a mesma lógica, com privatizações de linhas de metrô e trem que resultaram em aumento de tarifas e queda na qualidade dos serviços. A falta de investimentos em infraestrutura básica, como sistemas de drenagem e conservação ambiental, é agravada pela terceirização da força de trabalho, que compromete a especialização e a eficiência do atendimento às emergências. Em 2023, o governo do estado investiu somente 40% da verba aprovada para infraestrutura hídrica e combate a enchentes. Esse processo evidencia como o Estado, em vez de garantir condições dignas de vida, opera como um instrumento das classes dominantes para reproduzir o capital, mesmo às custas da segurança e do bem-estar da classe trabalhadora.

Crise climática: contradições do modo de produção capitalista

A intensificação da crise climática, com eventos extremos cada vez mais comuns nas cidades brasileiras, é produto do modo de produção capitalista, que subordina os ciclos naturais às exigências da acumulação de capital. O desmatamento, a crescente impermeabilização do solo e a destruição dos ecossistemas não são desvios, mas partes inerentes do sistema capitalista-estatista, que vê a natureza apenas como uma fonte de recursos e um depósito de resíduos. As crises ambientais são efeito das contradições do capitalismo-estatismo, e somente a superação desse sistema poderá interromper a destruição ecológica em larga escala.

Solidariedade, ação direta e luta de classes

Diante da negligência das autoridades de estado e do colapso dos serviços públicos, a organização popular autogestionária emerge como uma resposta fundamental. Enfatizamos a necessidade de articulação de uma luta de classes organizada, capaz de confrontar diretamente as classes dominantes e seus interesses. Não há espaço para conciliação, é preciso defender a solidariedade de classe e a ação direta como formas de resistência e construção de um poder popular autogestionário. É necessário também superar a falsa polarização institucional que cega as classes oprimidas em disputas que as fazem defender os projetos de diferentes setores internos das classes dominantes, que no fim buscam a manutenção do sistema capitalista-estatista.

Um futuro além do capitalismo

A tragédia das chuvas em São Paulo não é inevitável, mas resultado de escolhas políticas que priorizam os lucros em detrimento da vida e do meio ambiente. Sob nossa perspectiva, a solução está na construção de uma sociedade onde os recursos sejam socializados e as decisões tomadas de forma coletiva. A autogestão popular e a organização econômica baseada nas necessidades humanas, e não no lucro de poucos, são passos fundamentais para superar o caos urbano e climático que o capitalismo nos impõe. Em uma plano mais imediato, é necessário construir organismos de organização popular nos territórios, com a orientação de independência de classe que seja capaz de defender seus interesses locais, e que tenha capacidade de articulação para barrar os ataques em um âmbito maior.

O caos mais uma vez presenciado em São Paulo, assim como todos os eventos climáticos extremos que a população brasileira tem enfrentado nos últimos anos, têm um causa. Dentro da lógica do sistema capitalista-estatista, continuaremos presenciando essas catástrofes em cada região do mundo. Por isso se faz cada vez mais urgente a luta coletiva por um mundo justo e igualitário!

Organização Socialista Libertária
Janeiro de 2025